O "Complexo" e contraditório discurso do Porto Sul

Ação Ilhéus.

Escrito por Maria do Socorro Mendonça

Sex, 11 de Setembro de 2009

O Projeto conceitual “Complexo” Porto Sul, mais uma vez é apresentado à população da cidade de Ilhéus. Agora, o Governo Municipal, através da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, faz a sua terceira palestra. Desta vez no auditório da Faculdade de Ilhéus. Os Professores da Faculdade de Ilhéus, Ismeraldo Pereira e Almir Milanesi (anfitrião), enfatizam a importância do desenvolvimento sócio econômico, ignorando por completo nas suas falas, a questão ambiental sem sequer citar este aspecto e isso acontece às vésperas da Conferência das Partes (COP 15) da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que acontecerá em dezembro deste ano. Estamos diante de um modelo de desenvolvimento econômico predatório, proposto de forma midiática pelo Governo do Estado da Bahia, em detrimento da proposição do mundo para a sustentabilidade, levando em consideração a geração de emprego e renda sem o desastre ambiental com conseqüências drásticas para os Seres humanos que habitam a Região de influência do “Complexo” Porto Sul, com peças promocionais e palestras eivadas de contradições, baseadas em um projeto ainda conceitual. CONTRADIÇÃO 1 - INDICADORES DE QUALIDADE Proferindo de forma totalmente contraditória a sua palestra, o Secretário de Desenvolvimento Econômico, Alfredo Landim, com um currículo rico baseado numa economia desatualizada onde o PIB é o indicador apresentado para mensurar a qualidade de vida, falou da economia agroflorestal do cacau como acabada, referindo-se a números hoje que representam 1/3 do que foi na sua época áurea, quando Ilhéus era o maior arrecadador estadual de ICMS, esquecendo de citar, que mesmo sendo tão rica àquela época, a desigualdade social era tão grande quanto é hoje, com 54% da população abaixo da linha de pobreza. O ICMS arrecadado no nosso município nunca retornou para contribuir com redução da desigualdade ou foi capaz sequer de preparar nosso município do mínimo necessário para a qualidade de vida do seu povo, como rede de saneamento básico e hospitais equipados e ainda educação de qualidade. Foto: Clodoaldo Ribeiro CONTRADIÇÃO 2 – TURISMO E PORTO DE MINÉRIO DE FERRO SÃO COMPATÍVEIS      Fotos divulgação 1 e 2 – Portos de Ubu – ES e Itaqui – MA Fotos divulgação 3 e 4 – Portos de Barcelona e Londres O Secretário ao tempo em que falou do Turismo como não sendo a solução para geração de emprego e renda suficiente para atender a demanda existente, pontuando a sua experiência nos 37 anos de vida na Região, aponta o “Complexo” Porto Sul, como propulsor desta atividade econômica, ao contrário do que aponta aAvaliação Ambiental Estratégica do LIMA (Laboratório Interdisciplinar do Meio Ambiente) contratada pelo Governo do Estado, que diz que ocorrerá, com a implantação do empreendimento naquela área, ocomprometimento significativo da situação de portal para toda zona turística do litoral Norte de Ilhéus até a Baía de Camamu. Continuando a série de contradições neste tópico, agora o Governo apresenta como sendo excelente, a atração de investidores ingleses, para 2.ª moradia, enquanto durante todo o ano passado, o grupo inglês que tinha um empreendimento da ordem de R$500 MM foi totalmente criticado, e a Secretaria de Turismo do Estado os induzia a trazer uma bandeira de projeção internacional, justificando ser necessário número de leitos e não residência como 2.ª moradia. Os nossos ingleses se foram! Ainda, a antiga peça promocional,um vídeo em 3D, mostra aos desavisados Portos maravilhoso no mundo, que convivem com o Turismo, como exemplo para o Porto Sul. Foto: Master Plan WWD CONTRADIÇÃO 3 – POPULAÇÃO NOS PRÓXIMOS 10 ANOS E GERAÇÃO DE EMPREGOS Não foram suficientes essas contradições e nos deparamos com uma tabela progressiva da geração de empregos nos próximos 10 anos da ordem de 60.000 postos de trabalho, para atender uma demanda populacional que segundo o Secretário Estadual de Indústria, Comércio e Mineração à época da entrevista coletiva em Ilhéus, orgulhosamente disse que a população da área de influência do “Complexo” Porto Sul, que hoje é da ordem de 500 mil habitantes, vai dobrar, integrando o eixo Ilhéus – Itabuna. Ora, se apenas 50% dos novos habitantes, nos próximos 10 anos estiverem prontos para o trabalho, como serão empregadas as demais pessoas, feita esta operação simples de subtração? Certamente sairemos dos atuais propalados 25 mil desempregados para 190 mil. Acreditei neste momento, que não haveria mais contradições. No entanto, frustrada a minha expectativa, o Governo continua insistindo em sua apresentação conceitual, que o Porto Sul, escoará soja e isso não é possível, mesmo que o berço de atracação seja outro. O Porto de Ilhéus já voltou a exportar soja, conforme notícia no site da CODEBA em 19 de maio. Foto: Apresentação GOBA 4 – O QUE É ALVISSAREIRO? PORTO SUL OU PORTO DO MALHADO REVITALIZADO? Alvissareiro não é o “Complexo” Porto Sul e sim o que está no Diário Oficial da União, do dia 12 de agosto de 2009, que autoriza a empresa Keize Participações e Investimentos à rea lização de estudo de viabilidade e de avaliação de empreendimento para arrendamento portuário no Porto Organizado de Ilhéus, a qual demonstrou interesse em investir valores da ordem de R$300 MM para dragar o Porto, para o mínimo de 14 metros de profundidade, reativar o moinho, instalar um estaleiro para pequenos reparos de navios no mole, construir o terminal de passageiros, a retro área e outras intervenções, ficando assim, o nosso Porto totalmente viável para qualquer carga, exceto o ferro de Caetité, cuja mina tem vida útil de 15 anos, conforme divulga a própria Bahia Mineração. Foto: Castilho 5 – O QUE É VERDADE? Demonstrando com exemplos os investidores que já buscam transportar carga pelo Porto Sul, o Secretário Alfredo Landim fala da Magnesita e neste momento, fico aturdida, pois a Magnesita que tem atividade desde 1940 em Brumado tem como logística para escoar seus minérios uma ferrovia que liga aquela cidade a Salvador. O argumento da atração de minérios do Norte de Minas cai por terra, quando sabemos que a Norte Sul, já em construção, será uma grande concorrente, o que não nos dá a certeza de que estes produtos escoarão pela Oeste-Leste (EF-334), cujo projeto ainda é conceitual. Foto: Mary Berbert 6 – ZPE DEPENDE DO PORTO SUL? Continuando a saga das contradições, a ZPE que foi criada pelo Decreto número 97.703, de 28.04.1989, exatamente porque Ilhéus oferecia as condições de logística necessárias à sua instalação, agora é apresentada como uma das justificativas para a instalação do “Complexo” Porto Sul. A ZPE não precisa de Porto Sul, pois segundo o responsável pela ZPE de Ilhéus, nas apresentações que fez do Projeto, no CONDEMA (Conselho Municipal do Meio Ambiente), na Prefeitura (Comitê Tripartite) e na reunião da Agenda Ambiental com a presença da Diretora do IMA, Beth Wagner, declarou quando questionado, que a ZPE para existir não depende do Porto Sul, já que o atual Porto atenderá às necessidades que serão demandadas. Um detalhe importante é que a ZPE é alfandegada e portanto, também não precisa de aeroporto alfandegado. 7 – ATIVO AMBIENTAL OU REGULARIZAÇÃO DE PASSIVO AMBIENTAL? O maior risco para o meio ambiente, é o discurso do, já antigo, vídeo promocional do “Complexo” Intermodal, que apresenta como perfeita a coexistência da atividade portuária com o Turismo, exemplificando o discurso com Portos no Brasil e no mundo, que não exportam minério de ferro, quando deveria fazer esta comparação e nos mostrar imagens dos Portos da CVRD (Companhia Vale do Rio Doce), de Vitória do Espírito Santo (Açu e Tubarão) e ainda o Porto de Itaqui no Maranhão, mas as imagens seriam tão chocantes quando o portão da fábrica de cacau fechada com a crise da lavoura cacaueira, mostrada com um fundo musical digno de filmes de terror e imagens sem o colorido natural e isso dói na alma dos desavisados. Foto: Apresentação GOBA 8 – AGENDA AMBIENTAL NO PLANEJAMENTO QUE ENTENDE O PORTO SUL SUSTENTÁVEL Este mesmo vídeo apresenta o Secretário de Planejamento do Estado, Walter Pinheiro, com um discurso igualmente contraditório, com relação ao seu último discurso publicado no site da SEPLAN, cujo título é:Desenvolvimento sustentável: a única saída Ainda no vídeo, o Secretário do Meio Ambiente Juliano Matos, falando deativos ambientais e quando questionado, citou a regularização fundiária do Parque do Conduru que já é um passivo e deve ser quitado. Além disso, a criação de mais uma Unidade de Conservação na Lagoa Encantada que já é uma APA (Área de Proteção Ambiental) e não recebe a devida atenção por parte do Governo Estadual. Não podemos entender os investimentos citados como sendo ativo ambiental ou como mitigação, muito menos entendemos que manter 30% da área Decretada de utilidade pública, servindo como cortina para esconder o desastre ambiental das proporções que sabemos acontecerá, é medida mitigadora. Foto: AGECOM 9 – A BAHIA AINDA NO MILÊNIO PASSADO, NA CONTRA MÃO AMBIENTAL DO MUNDO Enfim, temos um Brasil ainda extrativista, exportando nossas riquezas não renováveis, quando poderíamos agregar valor e ganhar muito mais, pois este ganho deve atender a todos e não a poucos. Não podemos continuar fazendo o que sempre fizemos já que corremos o risco de obter o que sempre obtivemos. Este modelo não diminuiu as desigualdades. Exemplo disso é que, Regiões como a de Bento Gonçalves, tendo atividade econômica baseada na agricultura, cultura e turismo, tem apenas 10% da sua população abaixo da linha de pobreza, ao contrário do modelo proposto e realidade em Carajás, que tem 45% da sua população abaixo da linha de pobreza. Ilhéus tem 54% da sua população abaixo da linha de pobreza e o nosso objetivo é alcançar Bento Gonçalves e não Parauapebas. Precisamos de Governantes pensando e agindo de forma sustentável. Precisamos de políticas públicas voltadas para a sustentabilidade. Vivemos num novo milênio e temos que quebrar o paradigma do velho modelo de desenvolvimento econômico. 10 - SENSATEZ É certo que nem tudo foi ruim e agora destaco que bom, foi o Prefeito Newton Lima que, como sempre, prudente e elegante no seu pronunciamento abordou a preocupação com o desordenamento urbano, a questão ambiental, mas demonstrando acreditar que a formação do consórcio entre os municípios da área de influência (Ilhéus, Itabuna, Uruçuca, Itacaré, Itajuípe e Buerarema), poderá ser fator importante para que estas questões sejam contempladas com análises criteriosas. 11 – POPULAÇÃO INCENTIVADA PARA ACEITAR SUA PRÓPRIA DESTRUIÇÃO O Secretário Alfredo Landim, encerrou sua apresentação citando Sun Tzu , conclamando a todos os presentes a não perder esta batalha e eu quero lembrá-lo que não estamos numa batalha, não estamos numa guerra e por isso conclamamos a todos para unidos taparmos os ouvidos ao canto da Sereia, pois ele poderá nos levar às profundezas e trabalharmos o que é objetivo comum: GERAÇÃO DE EMPREGO E RENDA, REDUÇÃO DA DESIGUALDADE SOCIAL, QUALIDADE DE VIDA, sem destruir o que é imprescindível à nossa sobrevivência. Assim Ilhéus será justa e sustentável. Deixemos Sun Tzu para a disputa pelo Poder e que o POVO não seja usado como arma, atiçados uns contra os outros. Apenas exigimos daqueles que estão no Poder que respeitem a VIDA, em sua plenitude. Os Governos passam e quem hoje está no Poder, amanhã será um simples cidadão e poderá sofrer as conseqüências das suas inconseqüências. 12 – PRECISAMOS DE MAIS UM PORTO? OU BASTA TÃO SOMENTE UMA MARINA PARA DAR JUÍZO AOS NOSSOS ATUAIS GOVERNANTES? Vamos fazer juntos uma análise, com aquilo que já temos e pode realmente ser sustentável. Teremos um Porto Pesqueiro; uma ZPE; um Porto revitalizado e pronto para abrigar: um estaleiro, um terminal de passageiros, escoar grãos e transportar containers; um aeroporto que volta à sua normalidade; um pólo de informática que continua atraindo empresas e ainda podemos ter um Turismo ordenado, com projetos de 2.ª moradia, um cardápio de atrações do Pólo Litoral Sul para turistas durante todo o ano, com eventos culturais, científicos, de negócios, gastronômicos, ecológicos, etc. e ainda a solução da lavoura cacaueira que certamente agora, tem grande esperança com a proposta do Governo de “trocar” dívida rural por floresta. Primeiro a ORDEM e depois o PROGRESSO! Fotos: Luiz Fernando 13 – A VERDADEIRA E NECESSÁRIA REFLEXÃO Agora Senhores Governantes, eu os conclamo a contemplar a não instalação do “Complexo” Porto Sul, já que está mais claro ainda que ele escoará apenas minério de ferro, no Plano de Desenvolvimento Sustentável do Estado, o qual foi licitado no final do mês de julho próximo passado, consultando a população dos territórios.  E eu concluo este texto fazendo também uma citação: “Nunca se mente tanto como antes das eleições, durante as guerras e depois de uma caçada”                     Otto Leopold Eduard Von Bismarck – Schönhausen ONG Ação Ilhéus.